Proposta que tem causado polêmica
não só entre os operadores e doutrinadores do Direito, mas também entre
cidadãos comuns, a redução da maioridade penal se tornou tema muito discutido
em âmbito nacional, causando divergência entre aqueles que são favoráveis e os
que são contrários à medida que versa sobre diminuir para dezesseis anos a
imputabilidade penal. Ainda tramitando e esperando por votação para ser aceita
ou refutada, a mídia e a população estão ovacionando a redução, mas são muitos
os fatores de relevância esquecidos durante as discussões, fatores esses que
provam que a medida em nosso país não seria bem sucedida como em parte dos
países estrangeiros.
De fato, o Brasil não comporta tal
mudança, visto que nosso sistema prisional é extremamente deficiente. Não basta
- e não é cabível à realidade deste país - buscar como “solução” a prisão de
menores quando, na verdade, tantos outros problemas, sociológicos, políticos e
sociais, devem ser resolvidos com mais urgência.
Inicialmente, é preciso pensar na
estrutura penitenciária que possuímos. Além de defasada e abarrotada, sua
ineficiência é perceptível. Não há suporte para que mais presos sejam
recebidos, mas essa é apenas a ponta do “iceberg”. A real questão é o fato de
que a privação de liberdade em resposta a um crime deveria partir do princípio
da ressocialização do preso. O que acontece, no entanto, é uma marginalização
ainda pior, já que os presos criam seu próprio sistema opressor, nos quais os
mais fracos veem-se submetidos à pressão de outros que, embora na mesma
condição, são considerados líderes. Colocar os jovens ainda mais cedo nesse
círculo vicioso de encarceramento e revolta seria apenas um passo para
torná-los adultos mais perigosos, já que nenhuma experiência é válida em
cadeias sem caráter educativo.
Em segundo lugar, vem o próprio
jovem. Existem motivos para que a maioridade penal de dezoito anos seja
cláusula pétrea e um deles é o fato de que o jovem ainda não tem
desenvolvimento psicológico e emocional completo, como consta em artigos esparsos
da própria Constituição Federal. Ao contrário, jovens marginalizados costumam
vir de uma realidade de pobreza e situação de vida precária em todos os
sentidos. A carência de informação, bem como todas as demais, faz com que
procurem abrigo em situações sociais deploráveis. Justamente por isso, são as
medidas socioeducativas que devem ser aplicadas a eles; não se fala, aqui, em
deixá-los impunes, mas de adotar padrões reais de ressocialização.
Se o adolescente possui civilmente
capacidade apenas relativa, é impossível que tenha capacidade penal, visto que
esta é ainda mais complexa. Antes de completar dezoito anos, todo ser humano é
considerado relativamente incapaz perante o Direito Civil e, portanto, deve ser
também perante a sociedade. Se este mesmo jovem não tem consciência plena de
seus atos e não pode responder sozinho por nada, não se pode exigir que seja
totalmente capaz perante o Direito Penal. Aqui se fala em todos os níveis
sociais: todo e qualquer adolescente – incluindo os elitistas – é considerado
relativamente incapaz entre dezesseis e dezoito anos, de acordo com o Código
Civil.
Por último, é necessária a análise sobre
quem são as pessoas que defendem essa mudança: a elite, apoiada pela mídia.
Pessoas que não são atingidas pela realidade social, exceto quando passam por
alguma experiência da qual o jovem é o centro. O ponto de vista mais explanado
pelos favoráveis à redução é o fato de que os criminosos usam os
menores-infratores para cometer seus próprios crimes sem sofrerem punição. Os
menores que compactuam com isso, por sua vez, são coagidos ou agem como bodes
expiatórios por terem pouco a perder perto do que o grupo do qual se sentem
parte tem a oferecer. Os defensores da redução garantem que situações como
essas não aconteceriam mais com a medida, já que os jovens estariam vulneráveis
às mesmas penas mais severas.
A banda, no entanto, toca de outra
maneira. Não podendo mais usar seus “comparsas” mais novos, os grupos criminais
simplesmente partiriam para pessoas com ainda menos idade, instruindo até mesmo
crianças no ramo criminal. E assim entraríamos em eternas discussões de redução
de maioridade penal, até que em determinado momento da humanidade “bebês” possam
ser culpados por crimes adultos para que estes não sofram as consequências. Uma
ironia exagerada, é claro, mas que retrata bem o efeito dominó da situação.
Adolescentes dispostos a “trabalhar” pelo grupo não faltam frente ao que lhes é
oferecido como recompensa: a inclusão social, ainda que em um grupo marginal.
É certo que não queremos ainda mais crianças
de nove anos praticando roubos, tráficos e homicídios em nome de criminosos
mais velhos, como já acontece, mas é a tendência que nos aguarda caso a
preocupação atual continue sendo uma emenda constitucional que sequer é válida,
em detrimento de assuntos importantes como o funcionamento – por enquanto
inexistente – das funções essenciais de uma punição, seja ela qual for.
Josiana Priscila Rezzardi, acadêmica do curso de Letras da UTFPR campus Pato Branco.
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